O silêncio de Lula
Publiquei hoje na Folha de S. Paulo:
Lula perdeu. A soberba fez mais uma vítima. O presidente, com supostos 80% de aprovação, não elegeu sua sucessora no primeiro turno, como propalou nas últimas semanas. Toda a agressividade presidencial foi em vão.
As ameaças foram aumentando na mesma proporção que os institutos de pesquisa apresentavam o favoritismo da sua candidata.
Não custa imaginar como agiria discursando na festa da vitória que não houve. O silêncio de Lula nos últimos dias, caso raro, foi o mais extenso deste ano.
A oposição recebeu um claro recado das urnas. Há espaço para uma candidatura propositiva e oposicionista.
A maioria simples que o governo obteve foi graças ao apoio dos oligarcas (Sarney, Barbalho, Collor, entre outros), das centrais sindicais pelegas, dos velhos movimentos sociais sustentados com recursos públicos, das pesquisas que a cada dia jogavam uma ducha gelada na oposição e estimulavam o eleitor indeciso a votar na candidata oficial, da máquina estatal e de seus programas assistencialistas, e, finalmente, de Lula, que literalmente abandonou a Presidência para fazer campanha.
Apesar de tudo, o governo não obteve a vitória que imaginava. O segundo turno era tudo o que Lula não queria. Agora sua candidata vai ter as mesmas condições que Serra. Continuar falando por ela como fez no primeiro turno vai pegar muito mal.
O criador tem de dar alguma autonomia à criatura. Confundir apoio com tutoria, indica ao eleitor que Dilma não consegue caminhar com as próprias pernas.
A oposição terá nova chance. Não tem desempenhado bem o seu papel. Acreditou na fantasia de que somente 4% da população achava o governo ruim. E, depois dos resultados da eleição de domingo, é mais fácil crer no chapeuzinho vermelho do que nas pesquisas eleitorais.
O eleitorado apontou que a oposição tem de fazer política. Deve criticar (quem disse que o eleitor não gosta de crítica?) e propor alternativas. Chamar Dilma para o debate e não Lula. Afinal, é ela a candidata.
A verdadeira eleição, espero, começou na noite do último domingo. Até então, o que tivemos foi um mero simulacro. Debates monótonos, um amontoado de propostas desconexas, muito marketing e pouca política.
Foi o tipo de campanha que marqueteiro adora. Agora deve começar a eleição que interessa ao país. Longe daquilo que Euclides da Cunha, em 1893, chamava das "insânias dos caudilhos eleitorais e do maquiavelismo grosseiro de uma política que é toda ela uma conspiração contra o futuro de uma nacionalidade".
# por barbarah.net - 6 de outubro de 2010 às 09:32
Tenho a impressão de que você bebeu muita água das fontes de Euclides e Graciliano. Seu texto é de quem sabe o que fala. De que não brinca em serviço.Sério, sério, muito sério.
# por Nivalda Campos - 6 de outubro de 2010 às 10:49
Villa,
As propostas de um candidato para um país, especialmente no momento de uma eleição, não deve ser algo necessariamente público e de fácil acesso? Achei pouco democrático o acesso ao site "Proposta Serra: um programa de governo colaborativo" no qual há a necessidade de cadastramento para qualquer consulta, seja ao Programa ou a outras informações da página.
# por barbarah.net - 6 de outubro de 2010 às 11:30
De quem não brinca em serviço.
# por Anônimo - 6 de outubro de 2010 às 11:44
Professor Villa, análise consequente. A campanha das oposições deve ter clima de oposição, proposições de oposição. Para estabelecer o contraditório e enunciar os avanços que pretende colocar ao País. Legado existe. Candidato também. Falta o toque de oposição e a saída do comodismo de vários aliados que, o primeiro turno, esconderam-se. Para a campanha governista foi bom: o medo da popularidade de Lula fez com que muitos oposicionistas não trabalhassem pró Serra e cuidassem apenas de sua própria campanha. E o que aconteceu? Muitos perderam. Divisões não vencem nem jogo de bolinhas de gude. É de se esperar que tenham aprendido a lição que, aliás, vem desde 2002. Olhando bem, a candidatura governista não tem discurso. A candidata ficou na sombra do regente tutor. A campanha foi coordenada pelo e em função de Lula. Perdeu e perderá outra vez, caso as oposições tenham entendido que a popularidade pode, sim, ser confrontada. Exemplos: São Paulo, onde virou e fez o governador; Minas Gerais, onde fez o governador e o senador e poderia ter ganho de Dilma; Santa Catarina, Acre, Rondônia, Paraná. Não é pouco. Pode ser mais.
# por Anônimo - 6 de outubro de 2010 às 12:40
Depois da eleição tive a certeza que principalmente o estado de SP esta com saudade do FMI, das privatizações feitas com toda lisura, do salário abaixo de $100 dólares, do crédito só para os afortunados, da Polícia Federal amordaçada, das CPis abafadas, dos escandá-los não apurados (Ex: de Sivan a compra da reeleição). Agora acreditar que o PSDB é parametro para seriedade é o mesmo que acreditar no salário de R$600,00, isso sim é terrível. E o pior eles votaram novamente no Malufe. Dizer o que?
http://www1.folha.uol.com.br/poder/810430-lula-determina-guinada-na-campanha-de-dilma-que-vai-explorar-privatizacoes.shtml
# por Anônimo - 6 de outubro de 2010 às 12:44
Muito bom texto. Gostei da honestidade. Nada de ficar com "passa mão na cabeça" de quem não merece, mas é óbvio que Lula JAMAIS teve 80% de aprovação, mas conhecendo seu partido e seus aliados, é fácil notar que agiram como os assessores de Nasser durante o conflito dos 6 dias no Oriente Médio, e sabe-se muito bem o que aconteceu... abraço
# por Ana Estrela - 6 de outubro de 2010 às 23:21
Marco Villa !!!
Concordo muito do que escreveu sobre o momento atual. Acredito e respeito muito seu conhecimento, bem como a ousadia de esta no tempo presente, fiel a princípios e a história. (trouxe-nos o próprio Euclides da Cunha).
Mas sinceramente tenho sentido seu tom, sua expressão com uma força, maior que seu compromisso de esclarecer, mostrar, alertar, e também desafiar a todos por tempos melhores. Em especial os líderes que podem de modo efetivo fazer mais e melhor.
Por favor, fique atento ao seu modo atual, pois confesso chega a “gritar”, e você não precisa disso, suas palavras quando ditas (ou escritas), já entoam verdade, consciência e lucidez.
Perdoe-me a ousadia, mas creia que tenho grande admiração e reverencia a sua atuação, como historiador, professor e cidadão e ser humano (gente da melhor qualidade).
# por Ana Lúcia K. - 7 de outubro de 2010 às 02:28
Prezado Villa,
Perfeita a sua análise, o lulla não contava com este 2ºturno, pois já eram "favas contadas." Dançou! E sabe com qual música? A do Tiririca!KKKK
Nuncantesnaiísstóriadecepaíz, esse prizidenti ficou tão calado, um alívio!
Continuo acreditando naquela sua frase: "Só o pt pode acabar como pt". E já começou.