"Num país sério, seria um escândalo"

Esta entrevista foi publicada hoje em "O Globo":

O GLOBO: O senhor acha que houve uso da máquina?

MARCO ANTONIO VILLA: Estatal? Sem dúvida. Como nunca. Nunca na História deste país, como disse certa pessoa, a máquina estatal foi tão utilizada. Inclusive abandonando a agenda de trabalho. Nas últimas sextas-feiras, ele (o presidente Lula) abandonou a agenda e as funções administrativas. Colocou-se em campanha de uma forma... Uma coisa é apoiar um candidato. É legítimo. Outra coisa é pôr a máquina estatal, ministérios, secretários, os 25 mil cargos de nomeação direta ou indireta a serviço da candidata oficial. Até as universidades públicas. Há dias, o reitor da UFRJ deu declaração favorável (a Dilma). Não é um país sério, é um país de Macunaímas. Se fosse um país sério, seria um escândalo. Não é por que a lei é omissa que você vai ter uma atuação política que fira a ética.

Mas nunca usaram a máquina antes?

VILLA: Desta forma, não. Mas não inauguraram o uso da máquina. Ele existe desde 1945. Mas nessas proporções, com o presidente fazendo discurso e dizendo que quer exterminar o adversário, eu nunca vi. O presidente se preocupa com a eleição de um adversário no Amazonas, no Piauí, no Ceará. Você transforma a grande política em questão pessoal. Não é por não gostar de um senador que vou dedicar parte de minha agenda a derrotá-lo, como no caso de Arthur Virgílio (PSDB-AM) ou Tasso Jereissati (PSDB-CE).

Foi o presidente quem derrotou esses senadores?

VILLA: Ele fez um esforço. No Ceará, foi claro. A questão que se coloca é um presidente sair pelo país fazendo campanha, usar a máquina dessa maneira. Ele prometeu fazer campanha depois do expediente e não cumpriu. O deslocamento (de Lula), quem paga?

O presidente deveria ter se licenciado?

VILLA: Essa é uma questão que Covas (Mario, governador de SP, morto em 2001) colocou na eleição de 1998. Temos de rever a lei. Sou favorável à reeleição. O eleitor, se gostou, tem o direito de reeleger. Mas a lei precisa ser aperfeiçoada. É injusta. Você pode ser candidato no cargo e seu adversário não pode. No caso da Presidência, se o adversário é um governador, precisa se desincompatibilizar. A lei precisa de aperfeiçoamento urgente.

Por que não a alteram?

VILLA: Porque depende do Congresso e há temas que não entram em pauta. Mas o Executivo, se quiser, faz. O Executivo aprova o que quer. Dilma, por exemplo, se for eleita, terá mais de três quintos da Câmara e do Senado. Portanto, tem quórum para aprovar o que quiser.

E isso o assusta?

VILLA: Claro. Eu vivi durante o regime militar, fui indiciado na Lei de Segurança Nacional, sei que não é muito agradável.

O senhor comparou esta eleição ao futebol de várzea?

VILLA: Tivemos um debate político rasteiro, decepcionante.

Os boatos contribuíram?

VILLA: Acho que não. De um lado, houve receio de se politizar as eleições. Há a ideia de se criar gerentes. Isso vem dos anos 1950. Adhemar de Barros batia nessa tecla: São Paulo precisa de gerente. O que falta é discutir política. Discute-se gerência quando o país é muito atrasado.

O uso da máquina colaborou com essa despolitização?

VILLA: Sim. Porque você coage os eleitores, impõe aos governadores apoiar a chapa oficial. Nós pensávamos que, com a urbanização do país, com a industrialização, os oligarcas seriam página virada. Ledo engano, doce ilusão. Nunca os oligarcas foram tão fortes como hoje. Identificase a política em alguns estados pelo nome de pessoas. Jader Barbalho, no Pará, Fernando Collor e Renan Calheiros, em Alagoas. A família Sarney, com dois representantes no Congresso, e um no Executivo estadual.

O senhor acha ainda pode haver uma virada na eleição?

VILLA: Tudo é possível. É como no futebol: só termina quando o juiz apita.

Em que José Serra errou?

VILLA: Ser candidato da oposição é muito difícil no Brasil.

Sim, mas isso não é erro.

VILLA: Houve um problema para estabelecer o arco de alianças. E houve muitos erros: o primeiro foi que (Serra) demorou para sair candidato. Dois: o partido não estava unido em torno da candidatura. Três: ao demorar muito, não conseguiu fazer alianças amplas nos estados.

A escolha do vice foi um problema?

VILLA: Sim. Demorou muito a sair a candidatura, porque você cria uma agenda negativa em torno do que é positivo. Esses fatores criaram um problema para estruturar o programa.

E Dilma, em que ela errou?

VILLA: Primeiro ela tem de levantar os braços para o céu por ter sido candidata. Ela é a candidata do bolso do colete do presidente, porque ele é candidato em 2014. Para ele, foi ótima a crise do mensalão, porque fez com que se livrasse dos rivais na direção do PT. Ele virou dono inconteste do partido. Ninguém mais se põe a ele. (Lula) estabeleceu as alianças que quis, e impôs pela goela abaixo do partido, sem ter oposição, a candidata Dilma. É o proprietário do PT, só falta registrar no cartório.

O uso da máquina terá peso em eventual vitória de Dilma?

VILLA: O uso da máquina é fundamental para uma vitória da Dilma. Agora, precisa ver como será a presidente Dilma. É um ponto de interrogação. O PMDB terá parcela considerável no governo, muito maior que hoje.

O governo de São Paulo também usou a máquina?

VILLA: Acho que depois do que eu vi na esfera federal... Falar que teve uso da máquina em São Paulo, acho que nem o Mercadante (candidato do PT ao governo) disse. Eventualmente pode ter tido uso em discursos.

Entrevista RTP

Dei esta entrevista para a RTP na última quarta-feira.

Brazil's presidential campaign

Saiu hoje no The Economist:


HOW much credence should Brazilians be giving to opinion polls? Before the first round of the elections on October 3rd they predicted Dilma Rousseff of the left-wing Workers’ Party would win with an absolute majority. In the event she fell short by three percentage points, more than the margin of error. Pollsters mis-called quite a few other races too, most egregiously in São Paulo, where Aloysio Nunes topped the poll for the state’s two Senate seats with the largest personal vote of any Brazilian senatorial candidate ever. He was predicted to come third.

The accuracy of forecasts matters not only for those who want to know what is likely to happen in the presidential run-off on October 31st. It may also affect the results themselves. The polls make the political news, points out Marco Antonio Villa, a historian at the Federal University of São Carlos. That means they influence both the candidates’ strategies and the choices of the electorate.

The last few polls have put Ms Rousseff on between 53% and 57%, a big difference in a two-horse race (she is facing José Serra of the centrist Party of Brazilian Social Democracy). Those figures can’t both be right. Are either of them?

On the side of scepticism is the sheer difficulty of predicting the behaviour of an electorate of roughly 100m spread over half a continent, including some of the world’s richest and poorest people, by asking just a few thousand of them. Brazilian pollsters may be making it even harder than necessary by neglecting to ask respondents whether they actually intend to vote. This is standard practice in most places, and the responses of those who say they are not sure are usually weighed more lightly or discarded altogether. In Brazil, pollsters don’t ask because voting is compulsory—but in practice, around a fifth of the electorate stays home on the day.

Against that is an interesting argument that at least in the first round of the presidential election, the opinion polls represent public opinion more accurately than the results themselves. Many Brazilians have had very little education and a tenth are illiterate, points out Alberto Almeida, a political scientist in São Paulo. He argues that by the time some of them had chosen one candidate for state governor and two each for senator and federal deputy—all identified by number, and with in some cases hordes of candidates to choose between—quite a few had unknowingly spoilt their vote or lost track of what they are doing entirely. And since poorer, less educated folk are generally more likely to plump for the person they think is already winning, the consequence is lower-than-predicted results for front-runners. In 2002 opinion polls gave Lula three percentage points more votes than the first-round result; in 2006, the difference was four points.

In favour of Mr Almeida’s theory is that he used it to predict publicly that Ms Rousseff would fail to win on the first round. If he is right, there is no particular reason to doubt the second-round polls, since the choices are much simpler (between two presidential candidates, and two candidates for governor in the states where no one won outright). That would give Ms Rousseff the victory, most likely with somewhere between 53% and 57%.

Amanhã

Amanhã estarei:
1. às 10 horas no UOL;
2. às 17 horas na TV Cultura;
3. às 18 horas na CBN Brasil (até às 21 horas);
4. às 22 horas no portal da Veja.

Nada de novo

O debate foi morno. Teve algumas boas questões levantadas pelos eleitores. A fórmula é boa mas poderia ser combinada com umas perguntas de jornalistas. Daria mais polêmica e dinamismo. Falta política no Brasil. A maioria dos eleitores não tem o menor interesse pelo tema. Votam por obrigação.

Continuo achando que o resultado está indefinido. Evidentemente que Dilma é favorita mas nada está decidido. A festa já está preparada em Brasília. No primeiro turno não deu muito certo.

Razões da indefinição:
1. o índice de abstenção. Pode favorecer decisivamente alguma candidatura. Foi de 18% a média nacional. Em alguns estados chegou a 23%. Falta de transporte e de mobilização de políticos (nas regiões ainda controladas pelo coronelismo), desinteresse popular e o feriado prolongado vão aumentar sensivelmente o índice nacional.

2. as pesquisas erraram feio no primeiro turno. Uma diferença de 10% significa que se o erro for de 5,1%, o adversário vence. É difícil mas é possível.

3. o número de indefinidos (depois de meses de campanha) não é pequeno.

Último debate

Tudo indica uma vitória de Dilma nas urnas. Para Serra é a última oportunidade de mostrar a sua mensagem. Tem de vencer o debate para, ao menos, tentar sair como líder da oposição (tudo dependerá, caso ocorra, do tamanho da sua derrota).

Logo vai chegar a hora do balanço da campanha.

A batalha das pesquisas

Depois da apuração, na noite do próximo domingo, poderemos avaliar as pesquisas. No primeiro turno os institutos foram muito mal. Continuaram fazendo as pesquisas da mesma forma e os veículos de comunicação divulgaram como se fosse uma antecipação do resultado.

Duvido que a diferença seja de 12 pontos. É muito. O favoritismo é de Dilma mas a diferença, hoje, é menor. Tem muito eleitor indeciso e as abstenções (no primeiro turno foi de 18% e no segundo deve passar tranquilamente de 20%) podem decidir a eleição.

Nesta semana a campanha perdeu fôlego. O sentimento de cansaço é evidente. Já o eleitor sente um certo enfado, não vê a hora de chegar o dia da eleição.

Entre Aspas

Hoje estarei no Entre Aspas, às 23 horas, na GloboNews. O tema, só podia ser, é a eleição de domingo.
EM TEMPO: um problema de última hora impediu que pudesse comparecer ao programa.

O grande vencedor

Publiquei hoje na Folha de S. Paulo:


A QUATRO dias da eleição, independentemente do resultado, o grande vencedor não foi candidato a nada. Ele conseguiu transformar uma desconhecida, sem voo político próprio, sem história no PT, em uma candidata competitiva. Os escândalos do primeiro governo, paradoxalmente, foram fundamentais para fortalecer seu poder sobre o partido. Livrou-se dos rivais. E o PT tem um só dono: Lula.

Foi gradualmente isolando os fundadores do partido. Antigos políticos do pré-64, egressos da luta armada e novas lideranças surgidas na resistência democrática, hoje giram em torno dele. Nada fazem sem a sua anuência. Aguardam que a "estrela de Belém" aponte o caminho. É o velho caudilhismo latinoamericano, messiânico e tosco.

Lula marcou sua vida sindical pela despolitização. Foi o que atraiu a atenção dos ideólogos do regime militar, como Golbery do Couto e Silva, que o recebeu várias vezes. Era uma espécie de muro de contenção contra os comunistas e o populismo representado por Brizola, os únicos adversários considerados pela ditadura.

O presidente sempre desprezou a discussão política, de princípios, de programas. Política foi, para ele, algo enfadonho, sem interesse, um debate sobre o nada. Quando obteve o domínio absoluto do PT, após a crise do mensalão, finalmente pode fazer o que sempre desejou, sem ter de prestar contas às instâncias partidárias. Além do que, tinha nas mãos o "Diário Oficial", que, no Brasil, funciona como um poderoso argumento.

Surfou no segundo mandato sem ter qualquer oposição. A confortável maioria no Congresso impediu CPIs e somente perdeu, no Senado, a votação da CPMF. De resto, fez o que bem quis. Deu rédea solta aos oligarcas, entregou fatias do governo e das empresas estatais para que saciassem a sua fome. E estabeleceu sólida aliança com o grande capital especulativo, a nova burguesia lulista, burguesia do capital alheio, dos fundos de pensão e do BNDES.

A aliança conservadora que passou a sustentar o governo é a garantia para o seu projeto continuista. Projeto pessoal. O partido pouco importa. Desde 2008, quando impôs a "mãe do PAC" como candidata, começou a planejar a sua campanha de 2014. Assim como Luís Bonaparte, "produz uma verdadeira anarquia em nome da ordem, ao mesmo tempo que despoja de seu halo toda a máquina do Estado, profana-a e torna-a ao mesmo tempo desprezível e ridícula". E se Getúlio voltou nos braços do povo, em 1950; Lula deseja regressar ao poder, daqui a quatro anos, nos braços dos velhos oligarcas e do capital financeiro.

Controle da imprensa

Fato importantíssimo (e que não foi dado o devido destaque) é a tentativa (mais uma vez) de controlar a imprensa. O governo chama de "controle social da mídia". É censura pura. E com a maioria que a aliança governamental tem no Congresso Nacional (além, caso vença, de deter o Executivo federal), não é exagero imaginar um projeto aprovado e com claro sentido intimidatório. Tempos sombrios nos aguardam.

O debate da Record

Sem graça. Repetitivo. Sem fato novo. O foco na corrupção já deu o que tinha de dar. Para a oposição, centrar fogo em algumas questões programáticas pode ser muito mais eficaz. Já Dilma vai empurrando com a barriga, aguardando o dia 31. Continua como favorita. E o sentimento de enfado vai invadindo quem acompanhou o dia a dia da campanha.

Debate na Record e a defesa das liberdades democráticas

Hoje teremos o penúltimo debate da campanha. Claro que o ideal é um bom debate, propositivo, pensando o Brasil do futuro. Mas, dificilmente, isto ocorrerá. O horário é péssimo (23 horas), escolhido à dedo para que a maioria dos eleitores não assistam.

A temperatura política baixou nos últimos dias. Ao invés de choques nas ruas, a estratégia é ir minando as forças democráticas. Um bom exemplo são os projetos de controle "social" da mídia. Já estão tramitando em 4 estados. Como a mais absoluta certeza é possível afirmar que o novo Congresso, que se instalará em fevereiro de 2011, logo vai apreciar um projeto deste tipo para ser adotado em todo o país. O governo, caso Dilma vença, terá maioria confortável nas duas Casas. Restará apelar ao STF, que, infelizmente, não tem tradição na defesa das liberdades. Pobre Brasil.

A última semana

Falta uma semana. Dilma continua como favorita. Mas a eleição está indefinida. Dilma não conseguiu ter vida própria na campanha. Mal sinal. Se vencer, será uma presidente fraca. O PMDB vai cobrar logo a fatura. A possibilidade de uma crise logo no início do governo é grande. Ela já se comparou a Joana D'Arc e a madre Teresa de Calcutá. Comparações absolutamente indevidas. No JN da semana que terminou, disse que depois de Indira Gandhi, ela foi a mulher que mais recebeu votos (47 milhões). Pura bobagem. Ninguém corrigiu. Na Índia, o regime, como até as vacas de lá sabem, é parlamentarista. Desta forma, Indira recebeu votos como deputada e não como primeiro-ministro.

Serra continua dependendo dos dois maiores colégios eleiotrais: São Paulo e Minas; além das abstenções. Ainda tem chances.

Pesquisas, novamente

O Brasil é um país incrível. A 3 de outubro todo mundo viu o fracasso dos institutos de pesquisas. Erraram feio na eleição nacional e em muitas eleições estaduais. Dois dias depois todo mundo já tinha esquecido. Agora, 20 dias depois da eleição, os institutos continuam divulgando as pesquisas como se tivessem acertado na mosca no último dia 3.

Com isso:
1. pautam o noticiário;
2. dão ao suposto vencedor um noticiário positivo;
3. desestimulam o eleitorado do adversário (lembrando que teremos um feriado na terça posterior à eleição);
4. jogam um balde água fria na candidatura que está em segundo;
5. estimulam o eleitor indeciso a votar no primeiro colocado, especialmente aqueles que não querem "perder o voto";
6. criam dificuldades financeiras para a candidatura que está em segundo.

Que Dilma tem um leve favoritismo, todos nós sabemos. Mas dizer que vai ganhar de goleada, aí é outra história.

A violência e Lula

O maior responsável por este clima de violência na campanha eleitoral é Lula. Ele abandonou suas funcções no governo só para fazer campanha. Se ocorrer algo mais grave, é muito fácil descobrir o causador: é o presidente Lula.

As declarações que ele deu (hoje) sobre a agressão sofrida por Serra no Rio foram lamentáveis. E não reconheceu o pior: a tentativa de impedir que Serra simplesmente circulasse pelas ruas da cidade, impedido que foi pela ação truculenta de cabos eleitorais de Dilma.

Se estão fazendo isso agora, antes das eleições, imagine o que farão, caso ganhem, depois do dia 31.

Novas denúncias

Mais denúncias revelam o submundo desta eleição. Não se sabe se terão alguma influência no eleitorado. Falta muito pouco tempo para a eleição.

A Record vai fazer o debate em um péssimo horário (23 horas). Não é acidental. Deve muitos favores ao governo. E paga "religiosamente".

Pesquisas

As pesquisas voltaram assombrar o eleitor. os resultados são bem diferentes. Nas 3 divulgadas recentemente indicam Dilma em primeiro. A próxima a ser divulgada será do Datafolha, no fim de semana.

Que Dilma possa estar em primeiro, é possível. Aunda é a favorita. Agora, a diferença entre ela e Serra indica pelos institutos (especialmente Vox Populi e Ibope) dá para desconfiar. E o melhor exemplo foi o resultado das urnas do último dia 3.

Apesar de toda gritaria, os insitutos de pesquisa continuam agindo da mesma forma, como se tivessem acertado seus prognósticos. O pior são os veículos de comunicação que abrem generosos espaços divulgando as pesquisas. Elas (e já escrevi sobre isso) induzem o eleitor vacilante a votar no primeiro colocado, desarticulam alianças polítcas, pautam o noticiário e inclusive criam problemas para o financiamento das campanhas.

Vale Tudo

Publiquei hoje na Folha de S. Paulo:

ESTAMOS ASSISTINDO à eleição mais disputada desde 1989. E, como era esperado -até em razão da indefinição de parcela do eleitorado-, a mais violenta. Nada indica que a virulência dos discursos e as ameaças diminuirão. O governo está usando todas as armas. As entidades e movimentos sociais pelegos estão a pleno vapor apoiando a candidata oficialista. Afinal, foram sustentados durante oito anos e agora é a hora de pagar pelos serviços recebidos antecipadamente.

É o momento do vale tudo. Com um coquetel ideológico infernal, o governo conseguiu reunir apoio que vai de José Sarney, passa por Renan Calheiros, chega a Fernando Collor e termina em Oscar Niemeyer. Sem esquecer Jader Barbalho, Paulo Maluf e Newton Cardoso. Dos políticos nacionais é a escória, o que existe de mais nefasto. Da antiga esquerda, são os velhos stalinistas, que nunca viram nada de errado nas ditaduras socialistas, nos campos de concentração, na morte de milhões de cidadãos, na supressão das liberdades.

É uma perversa aliança que tem muitos pontos em comum, como o ódio à liberdade de imprensa, de manifestação e de organização.

Além da política da boquinha, do saque organizado do erário público, que vai do ranário ao edifício público monumental, mas inabitável.

Lula já pensa no futuro. Está no estágio de que não mais dissocia sua ação daquela vinculada aos destinos do país. Vestiu o figurino de salvador da pátria. E gostou. A cada dia fica mais irritado com a oposição. Não aceita qualquer questionamento. Sua ação está paulatinamente saindo do campo da política. Ficou furioso com a realização do segundo turno e as derrotas nos estados de São Paulo e Minas. Achou uma ingratidão.

O segundo turno contrariou seus projetos para o futuro. Queria vender para o mundo uma unanimidade que nunca teve. A imprensa mundial, que serviu de caixa de ressonância para seu projeto, ficou estupefata com o resultado das urnas, pois acreditou nas bravatas. Lula necessitava vencer de goleada para tentar obter algum cargo em uma instituição internacional. Se pôde salvar o Brasil, porque não o mundo? Mas o realismo das grandes potências -especialmente depois da trapalhada envolvendo o Irã- afastou qualquer possibilidade do "ungido", o "esperado", pudesse regressar de sua breve odisseia e retomar o poder.

Teremos mais dez dias de acusações, calúnias e coações de todos os tipos. É a "república hilariante", como bem definiu Euclides da Cunha, caracterizada pelo que chamou de "bandalheira sistematizada". Pobre Brasil.

Pesquisa Vox Populi?

Vai ser mais uma pesquisa (?????) Vox Populi. É incrível a cara de pau do pessoal. Depois da palhaçada do primeiro turno, eles continuam falando em pesquisa sem sequer ficar ruborizado. Qualquer resultado que apresentarem é uma farsa.

Debate de ontem

Fui à RedeTV assistir ao debate. Sempre fica a sensação de algo incompleto. E de meio falso, como na entrada onde "militantes" do PR, partido do Valdemar (mensalão) e do Tiririca acenavam bandeiras com os dizeres: "PR é Dilma". Para quem? Eram pouquíssimas pessoas lá presentes. Claro que era para agradar Dilma e cobrar a fatura no futuro.

Religião sumiu do debate, assim como o aborto. Deus apareceu uma vez e citado por Dilma, logo no início. O debate começou com uma questão boba proposta pelo mediador: que cada um falasse o que achava de bom e ruim no outro. Coisa vazia, pobre. O debate começava mal.

Dilma era monotemática: só falava em privatização. Serra tentava ampliar os temas com o FAT, infraestrutura, drogas, etc. Dilma manteve a fala agressiva do debate na Band. Serra buscou um ar sereno mas respondendo às acusações de Dilma.

Até a metade do debate, a discussão estava pobre, repetitiva em relação ao debate da Band e à propaganda gratuita. Dilma cometeu muitos erros, como o de falar de um caso em SP que ninguém sabia bem o que era. O eleitor deve ter ficado com cara de bobo.

A discussão sobre privatização acabou tendo bons momentos.

Algumas passagens do debate parceciam preparadas para serem usadas na propaganda gratuita na TV. Outras ficaram incompreensíveis para o grande público (como no momento que a Dilma falou "da Castelo de Areia", como se o público soubesse que era uma operação da PF e seu objetivo).

Vez ou outra repetiu-se aquele clima de esquizofrenia, com os candidatos repetindo sem parar uma montanha de números.

Em resumo: Serra esteve melhor, mais tranquilo e claro. Dilma continua nervosa e pouca clara. Não foi uma vitória inconteste de Serra mas ele foi melhor que ela. Faltam ainda dois debates Record e Globo).

Contudo, a discussão eleitoral continua sendo pobre. Temas econômicos, de política científica, de desenvolvimento regional, etc, etc, ainda não foram tocados. E isto desde o início da campanha.

Debate

Hoje tem debate às 21 horas na RedeTV. Deve ser quente. É o penúltimo da campanha. Como convidado da Folha, devo assistir lá no estúdio da RedeTV. Amanhã faço minhas considerações.

Transferência e abstenção

O "Estadão" fez uma boa reportagem tratando da transferência de votos. O desafio será em São Paulo e Minas, como eu já tinha escrito. Só dos candidatos Alckmin e Anastasia "faltam" 5 milhões de votos, ou seja, eles tiveram esta quatidade de votos a mais do que Serra nos dois estados. Isto sem contar os votos da Marina.



No noticiário, como também já tinha escrito, vê-se que o PMDB está estabelecendo contatos com a direção da campanha de Serra. Querem ficar nas duas canoas.



Se a abstenção foi de 18% no Brasil, no Norte e Nordeste, em alguns estados, chegou a 23%. E tenderá a ser maior no dia 31, pois na maioria dos estados destas regiões, as eleições para o governo estadual, que puxa o comparecimento às urnas, foram decididas no primeiro turno. E sem ter alguém que pague a condução do eleitor, este dificilmente comparece, especialmente nas áreas onde o deslocamento é mais precário. Também tem o feriado do dia 2 de novembro, que vai incentivar o fim de semana prolongado da classe média. Estes dois fatores vão influenciar no resultado da eleição e NÃO são detectados pelas pesquisas.

Continua a indefinição

As pesquisas (e é sempre bom ficar com um pé atrás depois da eleição do primeiro turno, quando os institutos erraram feio) dão, em média, de 4 a 6 pontos a mais para Dilma. Lula fez ontem mais um comício na Zona Leste e durante a semana reapareceu na propaganda. Tudo indica que seja para ficar. Deve aparecer todo santo dia. É aquela história: pode ajudar ou prejudicar, neste momento da campanha (caso Dilma vença dirão que foi fundamental; se perder vão dizer que foi um excessivo protagonismo).

Já do lado de Serra foi crescendo o número de novos apoiadores. O candidato que parecia que seria derrotado no primeiro turno (no "Canal Livre" que participei, uma semana antes da eleição, o primeiro convidado, com base "em pesquisas", disse que ele seria fragorosamente derrotado......) transformou-se em participante no segundo turno em pé de igualdade com Dilma. Minas (e escrevi várias vezes sobre isso) é uma das chaves da eleição. O ato realizado esta semana em BH foi muito importante. Caso Aécio e seu grupo político consiga reverter (ou ao menos minorar) o quadro favorável a Dilma (no primeiro turno ela ganhou de 46 a 30), Serra já terá votos fundamentais. Em São Paulo, a diferença a seu favor tem de aumentar, para que ele tenha chance de vencer.

Seis pontos significam que basta crescer 3,1 para que suplante a adversária. Estas duas semanas serão de pura emoção. E o debate de amanhã, promovido pela Rede TV e Folha de S. Paulo, deve dar o tom desta fase final da campanha.

PV

O PV ainda não decidiu o que fazer no segundo turno. Marina também. Quanto mais tempo demoram para decidir, pior para o capital político que acumularam. Os eleitores vão tomando seu próprio caminho.
A tendência é a maioria do PV, como esperado, apoiar Serra. E Marina, o que fará? Não será fácil passar na primeira prova pós-eleitoral após ter recebido 20% dos votos. Mas se não ir bem agora, vai começar mal a administração do seu capital político. Ela não deve se esquecer que 4 anos em política é quase que a eternidade. E que sem um partido organizado nacionalmente, suas chances em 2014 são remotas.

Cenário de indefinição

A eleição está indefinida. A pesquisa IBOPE (da pesquisa Vox Populi nem vale a pena falar, tendo em vista o vexame do primeiro turno) mostra um cenário de queda acentuada de Dilma e crescimento de Serra. No fim de semana sairá mais um Datafolha e aí serám possível especular se está ocorrendo uma tendência de ascensão de Serra e de uma queda constante de Dilma.

Dilma perdeu o ar triunfalista. Lula está meio desaparecido. Os aliados regionais (fora do PT) estão com um pé atrás. Aguardam mais uma pesquisa para decidir o que vão fazer. São oportunistas, estiveram com ela pois imaginavam uma vitória fácil no primeiro turno. Podem abandoná-la se sentirem que vai perder. Daí que é ridículo imaginar que ela representa a "esquerda" e Serra "a direita". Bobagem. São dois projetos para o Brasil e que vão necessitar desta geléia geral que é o Congresso Nacional. A questão é como irão se relacionar com a turma do "é dando que se recebe".

Para Serra é vital uma grande vitória em São Paulo (bem maior do que os 3 pontos do primeiro turno) e uma virada em Minas, onde perdeu feio de 46 a 30. Neste caso, o "homem providencial" é Aécio. Caberá a ele comandar esta virada.

Neste cenário, o debate do próximo domingo da Folha/RedeTV será fundamental. Se Dilma mantiver o ar agressivo (e pouco propositivo) é um claro sinal de que a eleição pode estar indo para o brejo.

Manifesto em Defesa da Democracia

Já são mais de 84 mil assinaturas. Quem ainda não assinou (e gostaria de assinar), basta acessar:
www.defesadademocracia.com.br

Tigre de papel

Publiquei hoje na Folha de S. Paulo:



O PT NÃO gosta de ser atacado.

Na verdade, hostiliza quem o ataca. Tem enorme dificuldade de conviver com a crítica. Imagina ser o proprietário de um pensamento único, algo como o velho centralismo democrático leninista. Quem for contrário deve se calar. Seus dirigentes acabaram se acostumando com uma oposição pouco atuante. Que passou os últimos oito anos quase que em silêncio, temendo o debate, acreditando piamente nos índices de popularidade do presidente.

No início da campanha eleitoral o quadro se manteve inalterado. Lula foi desferindo na oposição golpes e mais golpes. Não encontrou respostas à altura. Dedicando-se plenamente à campanha -que é o que efetivamente gosta- fez política 24 horas por dia. Transformou o Palácio da Alvorada no comitê central da candidatura Dilma. Não temeu alguma reprimenda do TSE, pois sabe com quem está lidando. Abandonou a rotina administrativa e concentrou-se na campanha. Desferiu ataques aos adversários como se fosse um líder partidário e não um chefe
de Estado.

A oposição assistiu a tudo sem saber bem o que fazer. Temia enfrentar o rolo compressor do PT.

Quando, finalmente, resolveu partir para o embate, viu que o adversário era um tigre de papel. O eleitorado estava aguardando alguma reação. E o resultado de 3 de outubro não deixou dúvida: a maioria estava com a oposição, claro que em um universo dos mais diferentes matizes.

A derrota do primeiro turno transtornou os dirigentes do oficialismo. Consideravam a eleição ganha. Tinham até preparado a festa da vitória. Imputaram a culpa à oposição, que tinha denunciado escândalos, e mostrado as vacilações e contradições da candidata oficial. Era o mínimo que a oposição poderia fazer, mas para o PT foi considerado algo intolerável.

Agora chegamos à etapa final da campanha. Dilma jogou fora o figurino utilizado nos últimos meses. No debate da Band assumiu uma postura agressiva e que deve manter até o dia 31. A empáfia foi substituída pelas ameaças. O arsenal foi acrescido de armas já usadas em 2006, como a privatização. Sinal de desespero, pois o cenário é distinto e os personagens também. E deve fracassar.

Dilma está numa encruzilhada. A popularidade de Lula já foi transferida. Seus principais aliados regionais foram eleitos e dificilmente farão sua campanha com o mesmo empenho do primeiro turno. O PMDB não assimilou as derrotas do Rio Grande do Sul, da Bahia e, principalmente, de Minas Gerais. E, numa eleição solteira, o embate será de biografias.

Apareceu a oposição

Publiquei hoje em O Globo:

A campanha presidencial finalmente começou. Acabou a pasmaceira do primeiro turno. Agora é um combate franco entre duas propostas para o futuro do Brasil. O formato do debate do último domingo facilitou o confronto entre os candidatos. Algumas vezes, porém, pode até ter prejudicado a ampliação do leque dos temas a serem discutidos. Em alguns momentos, o programa ficou monotemático, ora a discussão era sobre a privatização, ora sobre o aborto. Os organizadores poderiam ter sugerido em cada bloco uma questão inicial para ser debatida entre os candidatos, deixando o restante do tempo livre para as perguntas entre eles. Dessa forma, os temas não contemplados acabariam sendo abordados e seria ampliado o leque de propostas discutidas.

Mesmo assim foi o melhor debate da eleição. Os ataques de parte a parte são absolutamente naturais. Eleição precisa ter situação e oposição. É uma obviedade, porém, no Brasil, dado o domínio exercido pelo PT e especialmente pelo presidente Lula, criticar o governo foi considerado algo temerário, perigoso. Temerário devido à popularidade de Lula, que foi superestimada pelos institutos de pesquisa. Se é exequível supor que o presidente é popular, é inimaginável que somente 4% da população achem ruim ou sofrível o governo.

Perigoso pois a crítica foi considerada um comportamento inadequado e que desagradaria ao eleitor. Ledo engano, como vimos após a abertura das urnas.

Com a finalização da disputa para os governos estaduais, nos maiores colégios eleitorais, a eleição presidencial acabou ficando solteira, independentemente das divergências regionais.

E isto é bom, pois valoriza os programas dos presidenciáveis e permitirá uma escolha mais ponderada por parte dos eleitores. Presidente não será somente mais uma escolha na cédula eletrônica: é a única na maioria dos estados.

Dessa forma o pleito acabou adquirindo autonomia e permitindo um reposicionamento dos eleitores. Isto pode favorecer o candidato José Serra, pois diminui o rolo compressor imposto pelo governo federal nos estados mais dependentes da União. Além disso, dificilmente o PMDB de Minas Gerais, Bahia ou Rio Grande do Sul vai fazer uma campanha entusiástica em defesa de Dilma Rousseff. As marcas e as mágoas da derrota são recentes e a neutralidade pode ser uma resposta.

Afinal, no cotidiano da pequena política, o que conta mesmo são as divergências regionais.

Foi necessário um recado explícito dos eleitores - afinal, a maioria dos votos, na eleição presidencial, foi para a oposição - para que ficasse claro que há um considerável espaço para o crescimento de uma candidatura oposicionista. Uma coisa é a avaliação do presidente, outra é a candidatura Dilma. Não há uma relação de absoluta transferência de votos de Lula para a sua candidata.

E seria um caso raríssimo na política mundial: um presidente, mesmo que bem avaliado, eleger uma quase desconhecida no cenário nacional, com a maioria absoluta dos votos, em um só turno.

O discurso lulista foi tão eficaz que pareceu uma surpresa o resultado da eleição do último dia 3. Tudo dava a entender que haveria somente um ato formal, meramente homologatório, do que já se sabia: Dilma seria a presidente do Brasil com uma votação consagradora. Muitos analistas - basta reler os jornais da última semana anterior à eleição - não só apontavam a fácil vitória de Dilma como já discutiam a composição do Ministério.

Agora estamos em um novo momento.

A eleição está indefinida. Somente o receio da derrota pode explicar a virulência de Dilma, no último debate, e a guerra estabelecida na internet. A empáfia foi substituída pela ameaça. E nos próximos 19 dias a campanha vai aumentar a temperatura como nunca na história deste país.

Tudo indica que Lula - que abandonou as funções presidenciais no último mês - percorrerá os principais colégios eleitorais do país, até às vésperas da eleição, intimidando, amedrontando a oposição e desenhando um cenário catastrófico para o país, caso Serra vença. Em cada discurso vai preparar as "deixas" para Dilma. Ele fará o trabalho considerado sujo e ela será encarregada de dar os arremates. Tudo o que não deveria fazer um chefe de Estado. Mas faz muito tempo que ele abandonou suas funções constitucionais para ser simplesmente o maior dirigente da campanha de Dilma.

Uma pergunta que fica é se o encanto do povo brasileiro com Lula está dando os primeiros sinais de esgotamento.

Sem ir para outros terrenos, na política o encantamento também tem prazo de validade.

Finalmente!!

Finalmente tivemos um bom debate. Poderia ser melhor, mas inegavelmente superou todos os outros. Ficar cara a cara estimulou tocar em questões polêmicas, como seria de se esperar. Dilma estava muito nervosa e agressiva. Serra esteve bem. Foi o seu melhor debate. E venceu.

Faltou ao debate um aprofundamento de vários temas. Além de outros que sequer foram tocados. É natural.

Fracassou a estratégia de colocar no centro do debate as privatizações, como em 2006. Dilma não é Lula.

Bancada do PV

O PV elegeu somente 37 deputados estaduais, 3 a mais do que em 2006. Não elegeu nenhum governador ou senador. Na Câmara dos Deputados elegeu apenas 15 deputados, 2 a mais do que em 2006. Ou seja, a candidatura Marina não fez o PV crescer de forma significativa. Fica mais enfraquecida a tese da terceira força. Os votos foram dela e não do partido. E dela numa conjuntura muito específica, muito difícil de se repetir em 2014, sem que faça um trabalho árduo de construção do partido por todo o país.

Debate

Hoje tem debate na Band ás 22 horas. É o primeiro de uma série de 4 ou 5. Desta vez ninguém vai poder fugir do debate. Finalmente, acho, teremos um bom embate e muita política.

1930

Fui um dos entrevistados do programa "De lá pra cá", de Ancelmo Gois, na TV Brasil e que vai passar hoje às 18 horas. O tema é a Revolução de 1930.

Tema religioso é exagerado, dizem especialistas; nos anos 1970, discussão envolvia a legalização do divórcio

Saiu em O Globo:

A inserção do debate religioso na campanha presidencial, em temas como o casamento entre pessoas do mesmo sexo e a descriminalização do aborto, nunca foi tão intensa na História recente da República, avalia o historiador Marco Antonio Villa, da Universidade Federal de São Carlos (SP). Se, no passado, as polêmicas entre Igreja e Estado tiveram seu auge na legalização do divórcio nos anos 70, hoje as discussões que envolvem moral e religião são vistas com exagero até por líderes cristãos.

- Em 2002, Lula estimulou a participação da ala evangélica na campanha e, hoje, o feitiço pode estar virando contra o feiticeiro. Nunca um tema religioso ocupou tanto espaço no debate eleitoral - diz Villa. - Se puxarmos o fio histórico desde o período anterior ao regime militar, entre 1945 e 1960, é a primeira vez que vemos tamanho conflito de opinião religiosa.

Para o historiador, a importância crescente do voto evangélico criou uma nova tendência, nas quais o posicionamento moral dos candidatos ganhará mais importância:

- O que a Igreja colocava em questão no passado era a oposição ao divórcio, mas era tema que nunca havia sido relevante no debate nacional. Não vejo essa nova era como algo para o bem ou para o mal, pois são temas que tocam a sociedade. A discussão sobre o aborto será boa, por exemplo, se não ficar apenas no debate eleitoral.

Uma discussão com cerca de um século
Daniel Aarão Reis, professor titular de História Contemporânea na Universidade Federal Fluminense, volta ainda mais no tempo para resgatar exemplos de influência religiosa na política. Começa a partir da Primeira República (1889-1930), quando era comum campanhas contra candidatos supostamente anticatólicos. Reis cita a Liga Eleitoral Católica, nos anos 30, que indicava aos católicos candidatos que professavam a religião. No período anterior ao golpe de 1964, eram famosas as cruzadas do rosário do padre Peyton e as Marchas da Família com Deus pela Liberdade. E, acrescenta que a, a partir dos anos 80, foi a vez dos evangélicos:

- Trata-se de uma tradição e de uma cultura política que, sem dúvida, explícita ou implicitamente, questiona o caráter laico do Estado e da República.

Cesar Romero Jacob, cientista político da PUC-RJ, estuda a influência do avanço no número de evangélicos na política. Ele não acredita que a escolha religiosa tenha poder de definir a eleição. Para Jacob, a religião é apenas mais um fator.

- Não acho que exista risco ao Estado laico, que o Brasil vire o Irã. A sociedade brasileira é muito complexa, nem todos os católicos e evangélicos querem um Estado religioso ou são contra o casamento entre homossexuais. Há gays em todas as religiões. O que o movimento de padres e pastores conseguiu foi o comprometimento dos candidatos para que não incentivem a legalização do aborto.

Presidente da Convenção Evangelista das Assembleias de Deus do Distrito Federal, o pastor Sóstenes Apolos da Silva é líder religioso da ex-candidata Marina Silva (PV). Afirma que o voto evangélico foi decisivo na alavancagem da candidatura da verde, e que assim será na definição do vitorioso neste segundo turno, apesar de achar que o debate está exagerado.

- É difícil avaliar o limite da interferência religiosa no Estado laico, pois toda pessoa tem um componente religioso, mesmo que seja a convicção de não ter religião - explica Sóstenes.

Mais Marina e PV

Bastaram 5 dias para acabar com a lua de mel entre PV e Marina. Alguns analistas, um pouco apressados, já davam ao PV o lugar de terceira força no jogo político.
É improvável que ela se decida por um dos dois candidatos. Tudo indica que vá manter a neutralidade.
O atraso no posicionamento pode ser ruim para ela. Os eleitores já estão pensando no segundo turno e fazendo a sua escolha.

A escolha de Marina

Marina está numa situação difícil. Tem de chgar a uma decisão que fique de acordo com o partido ou, no máximo, que não confronte o PV.
Para ela, a neutralidade é a melhor saída. Neutralidade com a reafirmação do programa apresentado nas eleições.
Caso o PV se decidir por um ou outro lado, vai bater de frente com Marina. A saída é liberar seus militantes.
Ontem, especialmente, o choque de Marina com o partido ficou muito claro. Cada lado tem uma análise distinta do que fazer no segundo turno.
O desafio é manter seu capital político até 2014. Mas se não consegue sequer manter um acordo com o PV para a eleição do próximo dia 31, não dá para imaginar que esta aliança sobreviverá por muito tempo.

PV e Marina

Tinha apontado no domingo que Marina não deve apoiar nem Dilma, nem Serra. Quer manter o capital político para a eleição de 2014. Vai insistir na discussão programática, como esperado.
Já os diretórios estaduais devem se alinhar, a maioria deles, com Serra, e outros com Dilma.
O PV não elegeu senhum governador e para o Congresso também não se destacou. É muito cedo para afirmar que será uma espécie de terceira via.

O silêncio de Lula

Publiquei hoje na Folha de S. Paulo:

Lula perdeu. A soberba fez mais uma vítima. O presidente, com supostos 80% de aprovação, não elegeu sua sucessora no primeiro turno, como propalou nas últimas semanas. Toda a agressividade presidencial foi em vão.

As ameaças foram aumentando na mesma proporção que os institutos de pesquisa apresentavam o favoritismo da sua candidata.

Não custa imaginar como agiria discursando na festa da vitória que não houve. O silêncio de Lula nos últimos dias, caso raro, foi o mais extenso deste ano.
A oposição recebeu um claro recado das urnas. Há espaço para uma candidatura propositiva e oposicionista.

A maioria simples que o governo obteve foi graças ao apoio dos oligarcas (Sarney, Barbalho, Collor, entre outros), das centrais sindicais pelegas, dos velhos movimentos sociais sustentados com recursos públicos, das pesquisas que a cada dia jogavam uma ducha gelada na oposição e estimulavam o eleitor indeciso a votar na candidata oficial, da máquina estatal e de seus programas assistencialistas, e, finalmente, de Lula, que literalmente abandonou a Presidência para fazer campanha.
Apesar de tudo, o governo não obteve a vitória que imaginava. O segundo turno era tudo o que Lula não queria. Agora sua candidata vai ter as mesmas condições que Serra. Continuar falando por ela como fez no primeiro turno vai pegar muito mal.

O criador tem de dar alguma autonomia à criatura. Confundir apoio com tutoria, indica ao eleitor que Dilma não consegue caminhar com as próprias pernas.

A oposição terá nova chance. Não tem desempenhado bem o seu papel. Acreditou na fantasia de que somente 4% da população achava o governo ruim. E, depois dos resultados da eleição de domingo, é mais fácil crer no chapeuzinho vermelho do que nas pesquisas eleitorais.

O eleitorado apontou que a oposição tem de fazer política. Deve criticar (quem disse que o eleitor não gosta de crítica?) e propor alternativas. Chamar Dilma para o debate e não Lula. Afinal, é ela a candidata.

A verdadeira eleição, espero, começou na noite do último domingo. Até então, o que tivemos foi um mero simulacro. Debates monótonos, um amontoado de propostas desconexas, muito marketing e pouca política.

Foi o tipo de campanha que marqueteiro adora. Agora deve começar a eleição que interessa ao país. Longe daquilo que Euclides da Cunha, em 1893, chamava das "insânias dos caudilhos eleitorais e do maquiavelismo grosseiro de uma política que é toda ela uma conspiração contra o futuro de uma nacionalidade".

Nova eleição

Como seria de se esperar, tem boato para todo e qualquer gosto. Mas o que importa é que Lula imaginava vencer com facilidade no primeiro turno. Quebrou a cara.

Agora cabe a José Serra fazer uma campanha digna de um oposicionista. Dilma vai tentar manter a mesma estratégia, evitando erros e bolas divididas.

Na quinta começa a campanha no rádio e TV. No fim de semana devem sair as primeiras pesquisas, aquelas que davam Aloisio em terceiro no sábado, dez pontos atrás da Marta. Para os que não sabem, ele venceu com mais de 3 milhões na frente de Marta. Netinho, o primeiro colocado nas pesquisas, ficou em terceiro. Sem esquecer que o Vox Populi deu, no domingo, 53% de votos para a Dilma.

TV Cultura e Folha

Amanhã sairá publicado na Folha de S. Paulo mais um artigo meu tratando da eleição. Hoje à noite estarei no Jornal da Cultura, às 21 horas, juntamente com o colega Vladimir Safatle, comentando as notícias.

Segundo turno

Vai ter segundo turno. Era tudo o que Lula não queria. E em São Paulo, Lula perdeu novamente.
Os institutos erraram novamente. Pela manhã, na TV UOL, já tinha cantando esta possibilidade.
O grande derrotado foi Lula. Vitória com sabor amargo. A soberba (como escrevi na quarta, na Folha) derrotou Lula.
Agora cabe ao PSDB finalmente entrar em campo. A chance de vencer existe. É difícl, mas existe. Primeiro, o partido tem de estar unido. Segundo, tem de ganhar os votos do PV (a maioria deles). Terceiro. tem de estabelecer novas alianças nos estados. Quarto, principalmente, tem de fazer política.

É hoje

Finalmente chegou o dia. A campanha foi ruim, uma decepção. Os debates foram inexistentes. Este modelo está falido. Culpa dos partidos políticos que votam uma lei eleitoral ruim e engessam os debates.
Dilma obteve uma vitória eleitoral mas não política. A forma como deve vencer e o engajamento de Lula enfraquece seu provável governo antes da posse. Foi mais que apoio, Lula instrumentalizou Dilma, transformando-a em uma boneca falante.
Não se sabe se teremos segundo turno. Havendo, Dilma sairá bem na frente. Mas acontecerá tudo o que Lula não quer: o confronto direto Dilma-Serra, governo-oposição.
O PSDB mais uma vez se dividiu, como em 2002 e 2006. Cada liderança cuidou da sua sobrevivência. O caso de Minas é o mais acabado. Aécio cuidou da sua candidatura em 2002 e 2006, abandonando Serra e Alckmin. Fez o mesmo em 2010. No Nordeste as lideranças do PSDB esconderam Serra. No Maranhão o candidato ao Senado pelo PSDB distribuiu material da propaganda com fotos ao lado e Lula e Dilma.
O pior, até agora, foi o silêncio em relação aos oligarcas que estão fortíssimos, mais fortes que em 2006. Volto a dizer: teremos o pior Congresso desde 1930. O Congresso não será de direita, centro ou esquerda. Será fisiológico, como sempre. A diferença será o número destes fisiológicos, sem esquecer os cacarecos. Sentiremos saudades do Congresso de 2010.

Pesquisas

A principal atração das eleições foram as pesquisas eleitorais. Em 2006 erraram feio no primeiro turno. Em 2008, os três principais institutos erraram nos três maiores colégios eleitorais (São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte) no primeiro turno. Caso errem novamente, vai ter muita polêmica.

A vitória da democracia

No sábado, na Globo News, às 21 horas, participo do programa "A vitória da democracia", que irá debater o atual processo eleitoral.

Campanha

A campanha foi muito ruim. Os debates foram fracos. O de ontem curou doentes de insônia crônica. Resta esperar, caso haja segundo turno, que possamos ter uma discussão séria sobre o futuro do Brasil.