Lula é o réu oculto?

Vale a pena ler a "Veja" desta semana e a reportagem sobre Marcos Valério. Aproveitando esta deixa, republico o meu artigo "Mensaleiros no tribunal" que saiu n'O Globo (24 de julho de 2012) e que possibilita fazer uma ligação com as declarações de Valério:



‘Mensaleiros no tribunal’Marco Antonio Villa





Depois de longa espera, finalmente o Supremo Tribunal Federal vai julgar o processo do Mensalão. A demora é só mais uma demonstração de quão ineficiente é o Judiciário. A lentidão é a maior característica do poder que devia ser célere, eficiente e, principalmente, justo. E não é por falta de recursos. Não. Basta observar as folhas de pagamento que, com muita dificuldade e depois de muita pressão do Conselho Nacional de Justiça, estão sendo divulgadas.
Os poderes Executivo e Legislativo estão maculados pela corrupção até a medula. Não há dia sem que apareça uma denúncia sobre o desvio de recursos públicos ou ao favorecimento de interesses privados. Os olhos do cidadão acabam, em um movimento natural, se dirigindo para o Judiciário. É um gesto de desespero e de impotência. Porém….
Não há otimismo que consiga reverter este quadro, ao menos a curto prazo. Vivemos um dos momentos mais difíceis da história republicana. Daí a enorme responsabilidade do STF no julgamento do Mensalão. Em 2005 fomos bombardeados por reportagens e entrevistas sobre o caso. O mais triste para os valores republicanos foram as sessões da CPMI dos Correios. Muitos depoimentos foram transmitidos ao vivo. Foi estarrecedor ouvir depoentes que tratavam de desvios de recursos públicos, de pagamento de campanhas eleitorais (como a presidencial de 2002) e da compra de apoio político no Congresso, com enorme tranquilidade, como se toda aquela podridão fizesse parte do jogo político em qualquer democracia. E quem agisse de forma distinta não passaria de um ingênuo. Em resumo, a ideia propagada pelos depoentes era de que política sempre foi assim.
Contudo, no decorrer dos trabalhos da CPMI, o clamor da opinião pública foi crescendo. A crise política se instalou. Alguns parlamentares do PT, envergonhados com a revelação do esquema de corrupção, saíram do partido. O presidente Lula foi à televisão e pediu, em rede nacional, desculpas pela ação dos dirigentes partidários. Disse desconhecer que, nas antessalas do Palácio do Planalto, tinha sido planejado o que ficou conhecido como Mensalão. Falou até que tinha sido traído. Não disse por quem e nem como.
O relatório final da CPMI pedindo o indiciamento dos responsáveis foi encaminhado à Procuradoria Geral da República. A aprovação foi comemorada. Em sinal de triunfo, o relator foi carregado pelos colegas. Para a oposição, o presidente Lula estava nas cordas, à beira de um nocaute. Caberia, disse, na época, um dos seus líderes, levá-lo sangrando até o ano seguinte para, então, vencê-lo facilmente nas urnas. Abrir um processo para apurar o crime de responsabilidade colocaria em risco o país. Estranha argumentação mas serviu para justificar a inépcia oposicionista, a falta de brio republicano e uma irresponsabilidade que só a história poderá avaliar.
Em 2007 o STF aceitou a denúncia. Foi uma sessão bizarra. Advogados se sucediam na tribuna defendendo seus clientes, enquanto os ministros bocejavam, consultavam seus computadores, conversavam, riam e ironizavam seus colegas. Dois deles ─ Ricardo Lewandovsky e Carmen Lúcia ─ chegaram a trocar mensagens especulando sobre os votos dos ministros e tratando outros por apelidos. Eros Grau foi chamado de “Cupido” e Ellen Gracie de “Professora”. O ministro Cupido, ou melhor, Eros Grau, chegou ao ponto de mandar um bilhetinho para um advogado, um velho amigo, e que estava defendendo um dos indiciados. Teve advogado que falou por tempo superior ao regimental e, claro, como não podia deixar de ser, fomos quase sufocados pelo latinório vazio, a erudição postiça, tão típica dos nossos bacharéis. Em certos momentos, a sessão lembrou um animado piquenique. Pena, que ao invés de um encontro de amigos, o recinto era da nossa Suprema Corte.
Apesar do clima descontraído, a denúncia foi aceita. E o processo se arrastou por um lustro. Deve ser registrado que, inicialmente, eram quarenta acusados e foram utilizados todos os mecanismos ─ que são legais ─ protelatórios. No final do ano passado, o ministro Joaquim Barbosa entregou ao presidente do STF o processo. De acordo com o regimento foi designado um ministro revisor. A escolha recaiu em Ricardo Lewandovski, o mesmo que, na noite da aceitação da denúncia, em 2007, foi visto e ouvido ─ principalmente ouvido ─ ao celular, em um restaurante de Brasília, falando nervosamente que a tendência dos ministros era “amaciar para José Dirceu”, um dos acusados. Mas que, continuou o advogado de São Bernardo, a pressão da mídia teria impedido o “amaciamento” (curioso é que nessas horas a linguagem é bem popular e o idioma de Virgílio é esquecido). O mesmo Lewandowski ficou seis meses com o processo. Foi uma das mais longas revisões da história. Argumentou que o processo era muito longo. Mas isto não impediu que realizasse diversas viagens pelo Brasil e para o exterior durante este período.
Depois de muita pressão ─ e foi pressão mesmo ─ , o ministro revisor entregou seu relatório. Só que, dias antes, o presidente Ayres Brito reuniu os ministros e estabeleceu o calendário do julgamento. Registre-se que Lewandovski não compareceu à reunião, demonstrando claramente sua insatisfação. O ápice das manobras de coação da Corte foram as reuniões de Lula com ministros ou prepostos de ministros. Se o Brasil fosse um país sério, o ex-presidente ─ que agora nega o que tinha declarado em 2005 sobre o Mensalão ─ teria sido processado. Mas, diria o otimista, ao menos, teremos o julgamento público do maior escândalo de corrupção da história recente.


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    # por O Mascate - 16 de setembro de 2012 às 13:07

    O Sebento de Caetés nunca foi oculto nessa presepada. Acontece que por conta do bom momento mundial e a economia acelerando no Brasil, os covardes gênios da oposição se encolheram e entenderam que bater de frente com a popularidade do EX presidente seria prejudicial aos planos futuros de cada um deles. Então, se fizeram de mortos e a situação blindou o Sebento com todas as forças.
    Deu no que deu.
    O EX presidente deveria estar no banco dos réus. se não está, temos que agradecer entre outros, a oposicinha fraca, interesseira e sem ideologia. Ética e moral, então...
    Mas, o Sebento pode cair em desgraça, a bola da vez nas babações de ovos agora é a PresidANTA Dilmarionete Ducheff, que entre outras coisas, não sabe nem porque está no poder. Mas como no Brasil dos sem noção, sempre irá existir um baba-ovo, ou um puxa saco para alavancar a popularidade da mulher quie ainda vai bater na casa dos 3000%. E o mensalão que ela sabia da existência não vai arranhar sua popularidade.

    E VIVA O BRASIL DO FUTEBOL E DA MARACUTAIA!!!!

    Esta semana vai começar a parte que interessa do julgamentio, agora veremos realmente o quanto nossos sinistros do STF são isentos as pressões.

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    # por Anônimo - 16 de setembro de 2012 às 18:21

    No início do julgamento eu estava mais otimista. Agora, não sei bem se temos algo a comemorar.
    Primeiro devemos registrar que o Mensalão tem sido julgado com velocidade incomum para os padrões da justiça brasileira, bastando ver o estágio em que se encontra os processos remetidos à primeira instância. Neste sentido, a rapidez do STF causa preocupação com o que seria um trâmite normal.
    Em segundo lugar, o julgamento só ocorreu porque alguém resolveu abrir o bico, e a imprensa não facilitou na marcação. Não esqueçamos que muitos fatos ficaram de fora das investigações, e que 40 poderia ter sido um número modesto de acusados.
    Finalmente, os fatos que integram o Mensalão são uma amostra de um universo que ocorre corriqueiramente desde não sei quando, e a grande maioria sequer passa perto dos portões do poder judiciário. Que o diga o artigo de hoje na Folha que nos deixa, no mínimo, com uma dúvida razoável do que possa efetivamente ter acontecido.

    http://www1.folha.uol.com.br/poder/1154238-ministerio-da-fazenda-oculta-sindicancia-na-casa-da-moeda.shtml

    Em tempo: não se conseguir - formal e juridicamente - provar algo nos tribunais, não é a mesma coisa que poder afirmar que ilegalidades não aconteceram.

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    # por opcao_zili - 16 de setembro de 2012 às 21:42

    Hoje falamos sobre esse impeachment em 2005. Se ocorresse, Lula sairia como golpeado, vítima e mais endeusado. Aí. sim, nunca mais sairia do governo e nos transformaríamos,rapidinho,numa república bolivariana.Foi bom deixar ( vemos agora) para que a destruição do mito criado por marqueteiros fosse completa.
    Repetiu-se o que fez Gurgel com Cachoeira - deu corda para que o forca fosse mais segura.

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    # por ubirajara araujo - 17 de setembro de 2012 às 08:30

    Corrupçao não é só pedir ou oferecer dinheiro, é mal usar o dinheiro público, como por exemplo receber sem dar a devida contra-prestação. Sem dúvida que no Judiciário, como disse Eliana Calmon existem bandidos que possuem patrimonio incompativel com a renda, mas existem aqueles que atravancam o bom andamento dos processos, isto tambem é ato de corrompem a ordem jurídica, a esperança do cidadão honesto.
    Por fim, não é só o Judiciário que age assim, o mesmo acontece no Ministério Público, no Conselho Nacional do Ministério Público, onde conselheiros engavetam processos. Como se poderia classificar a ação de um conselheiro que mantem em seu poder, pronto para julgamento um pedido de providencia desde abril de 2011 ?