Presidencialismo de transação
Estou republicando este artigo que saiu na Folha de S. Paulo em 23 de julho deste ano. Mantém a atualidade. A crise no Ministério do Esporte e a forma como o governo respondeu às gravíssimas acusações de corrupção na pasta, reforçam a tese central do artigo.
Presidencialismo de transação:: Marco Antonio Villa
FOLHA DE S. PAULO
A presidente Dilma anunciou que vai moralizar a alta administração pública. Boa notícia, mesmo que tardia. Afinal, herdou do antecessor essa forma de governar.
E já está com mais de um semestre como titular, ainda que eventual, da Presidência da República. Até agora, falou mais do que fez.
Tomou decisões, mas voltou atrás. Gritou, ameaçou, mas, de concreto, pouco fez no combate a uma das maiores mazelas do Brasil, a corrupção. Brigar com o PR e mostrar pulso firme com políticos de pouco brilho, mas muita esperteza, é fácil.
E se o PMDB controlasse o Ministério dos Transportes? E, ainda, se o ministro fosse um afilhado do senador José Sarney, o comportamento de Dilma seria o mesmo?
Evidente que não. Mostrar firmeza e compromisso público com a honestidade e com a eficiência é o mínimo que se espera da presidente. E que estenda aos outros ministérios as mesmas exigências (são para valer?), inclusive aqueles controlados pelo PT.
O PR virou o inimigo público número um. Numa espécie de catarse coletiva, agora é a sua vez, como já aconteceu com Renan Calheiros, José Sarney, Antonio Palocci e tantos outros. São revelados negócios pouco republicanos, nepotismo, obras inacabadas, um sem número de mazelas.
Alguns dos denunciados são nossos velhos conhecidos. Até poderiam estar em algum edifício público mais insalubre do que o do Congresso Nacional.
Os "republicanos" são peixes pequenos. Representam o baixo clero.
Não tomam parte nos debates parlamentares. Sobrevivem nas sombras. Seus momentos de glória ocorrem quando o governo, numa votação importante, necessita do seu apoio. Aí destilam o amargor, reclamam do esquecimento.
Mero teatro mambembe. Sabem que não têm condições de participar do cotidiano da vida parlamentar. Não estão lá para isso. Querem fazer caixa. E só.
Dilma prefere governar com o PR e asseclas que buscar debate aberto com todas as forças parlamentares.
Considera mais fácil e menos trabalhoso adquirir apoio político que obtê-lo no enfrentamento democrático entre governo e oposição. Tal método, consagrado por seu antecessor, empobrece a política e desmoraliza a democracia.
A estratégia de manter uma base heterodoxa e politicamente invertebrada, formada por 15 partidos, acaba gerando, a todo instante, crises de governabilidade, diversamente do que afirmam os defensores deste presidencialismo de transação. O país fica paralisado (e horrorizado, com razão) com as denúncias, e o debate político da conjuntura e do futuro do Brasil desaparece de cena.
A recorrência desse comportamento tem prejudicado o crescimento da economia e o combate aos graves problemas sociais.
Uma base tão ampla e sustentada só pela partilha da máquina do Estado acaba produzindo ineficiência administrativa, corrupção e perda (por falta de planejamento e quadros burocráticos capazes) de excelentes oportunidades, como os momentos de bonança da economia internacional, de 2003 a 2008, durante o governo Lula.
As Presidências petistas optaram por suprimir o debate político, garantindo folgada maioria parlamentar. Sem nenhuma ousadia, instalaram um modelo caracterizado por taxas anêmicas de crescimento econômico (e até negativa, como em 2009), por base de perfil neocolonial (60% das exportações são do setor primário) e por um distributivismo de viés conservador.
Dessa forma, não causa estranheza a companhia do PR e de seus métodos administrativos pouco convencionais como sócio deste projeto antinacional.
Marco Antonio Villa é historiador e professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).
# por Anônimo - 2 de novembro de 2011 às 13:36
Prezado Professor,
As conseqüências daquilo que o senhor descreve no artigo pode ser observada hoje na repercusão do problema de câncer do ex-presidente da república.
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/elianecantanhede/1000203-parem-com-isso.shtml
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/gilbertodimenstein/999070-o-cancer-de-lula-me-envergonhou.shtml
Confesso que, em princípio, não entendi todo o "burburinho" a respeito das sugestões para que o ex-presidente Luiz Inácio da Silva se submetesse a tratamento contra o câncer pelo SUS. Todavia, recebi um vídeo que talvez explique a razão de tanta "força" nos comentários e nas respostas.
http://www.youtube.com/watch?v=Sb2hoU-1AHU
Não me parece que foram poucas as vezes em que Lula contaminou questões pessoais com comentários políticos, absurdos muitas das vezes. Como deveriam ter se sentido os cerca de 58 mil pacientes que não puderam se submeter aos serviços de radioterapia ao ouvir a declaração acima do ex-presidente?
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/999709-tratamento-de-cancer-pelo-sus-atrasa-e-e-insuficiente-diz-tcu.shtml
De quem terá sido o radicalismo afinal? Daqueles que sofrem diariamente com serviços públicos de baixa qualidade, num país que tem uma das maiores cargas tributárias do mundo, ou de alguém que em dois mandatos poderia ter tomado ações mais efetivas para a melhoria destes mesmos serviços?
Por acaso Lula foi menos desrespeitoso (em várias ocasiões) que aqueles que, agora, sugerem que ele procure o SUS?
Assim como a violência está endurecendo os corações brasileiros - cansados da violência urbana, das balas perdidas, da corrupção em todos os níveis - também a realidade que acomete milhões de brasileiros deveria acender um radicalismo insano e agressivo por parte dos administradores públicos na melhoria URGENTE dos serviços públicos (obrigações constitucionais, diga-se). Talvez assim, um dia, tenhamos pessoas mais cordiais, descentes, humanas e civilizadas:políticos e cidadãos.
# por Anônimo - 2 de novembro de 2011 às 17:35
Villa;
Uma forma de combater essa excessiva centralização, e inchamento da máquina do Estado, não seria promovendo a descentralização administrativa, isto é, concedendo mais poder aos Estados?
# por Anônimo - 4 de novembro de 2011 às 13:47
Villa,
Você escre bem, trabalha bem as informações e argumentos que possui, em função de seu viés anti-petista, natural já que escreve para Folha. Porém, mais uma vez se torna comum, na análise das questões de corrupção, como se a corrupção no Brasil surgisse com o governo Lula, não reconhecendo o aumento do combate, investigação e punição á corrupção no governo Lula, diferente do seu governo FHC, em que a corrupção era velada, ou não era tão perseguida pelos meios de comunicação, dando nos a sensação de que não existia. A corrupção não é uma prática política, é uma prática do ser humano, presente na maioria das pessoas, sejam em ações cotidianas de suborno de um guarda de transito, ou em ações maiores envolvendo desvio de grande quantidade de dinheiro. Portanto, não existe governo que não haja corruptos, há menos que se troquem os ministros e funcionários, por robôs ou máquinas. O que existe, são governos que coniventes com a corrupção, e governos que combatem, e punem os corruptos. E combater a corrupção o Governo Dilma está fazendo, embora você diga que "Mostrar firmeza e compromisso público com a honestidade e com a eficiência é o mínimo que se espera da presidente" é um mínimo que, em nível de Brasil, deveria ser reconhecido e valorizado pela imprensa, não fosse a imprensa comprometida com os interesses particulares que conhecemos.
Outro ponto: Mais uma vez você aborda práticas naturais, infelizmente,da República, tais como a articulação política para obter maioria no congresso, como se fosse uma invenção petista, como se no governo FHC ele não procurasse obter maioria no congresso, ou como se a oposição DEM-PSDB estivesse realmente interassada em um debate político.
# por Helio. - 4 de novembro de 2011 às 21:31
O aparelhamento do Estado brasileiro aos companheiros (cabides de emprego sem que estes tenham competência para tal: cada mês cai um Ministro!!!!) deu na atual herança maldita do governo anterior ( 8 anos do maior falastrão da história republicana) , no desgoverno do PT, continuado pela pseuda faxineira Dilma. O que tem de diferente do governo FHC que o anônimo das 13:47 não consegue enxergar? A estabilidade econômica foi trocada pela corrupção, mensalão, dinheiro em cuecas, ONGs fantasmas, recorde de dinheiro para partidos políticos da base de apoio (caixa dois), educação de baixa qualidade, diminuição do IDH BRASILEIRO, insegurança pública, interesses privados acima do público (dinheiro para donos de ONGs etc... ), enriquecimento sem causa de Ministros de 1º escalão ( exemplo: Dirceu, Palocci e outros ...), palestrantes sem conteúdo nenhum, falando abobrinhas, como forma de receber dinheiro em troca de favores anteriores e a saúde do SUS esta na UTI a muito tempo ( LULA esta no Hospital Sírio Libanes, agora dependendo daqueles que estudaram, caso contrário já estaria sem sua afiada lingua). Mas o diferencial de hoje esta na imprensa livre ( apesar de tentarem mordaçar os meios de comunicação livre) e não nos orgãos do Governo ( PF, TCU, CPI etc...) que após denúncias de malfeitos ( roubo mesmo!) mesmo que contra vontade de quem esta levando o nosso dinheiro ( apadrinhados políticos) não resta outra alternativa: apurar, mesmo que seja sómente, para trocar a raposa do galinheiro.
# por Anônimo - 10 de novembro de 2011 às 19:26
lula não combateu a corrupção assim com Fhc tambem não, houve dezenas de evidencias de corrupção no periodo do fhc empuradas pra debaixo do tapete pelo engavetador geral da república, algumas gravissimas e absolutamente nada foi apurado, pelo menos no governo lula tivemos uma policia federal um pouco mais atuante. É impossivel eliminar 100 % a corrupção, o que se deve fazer e criar meios inteligentes de minimizala e um sistema judiciario mais àgil, isso não foi feito no governo lula e menos ainda nos seus antecessores. ( a idéia defendida por uns de classificar corrupção como crime hediondo seria um `bom incio )