É preciso fazer política
MARCO ANTONIO VILLA
Se o país mantém sua economia em um ritmo razoável, que permite aprovação raspando, com nota cinco; a política vai muito mal. É curioso o descolamento da política em relação à economia. Lembra um pouco, guardadas às devidas proporções, o período do milagre brasileiro, durante o regime militar. E se a ausência da política - devido a repressão - acabou mostrando que sem discussão não há nenhum crescimento sustentável da economia (basta recordar a crise do milagre), o mesmo caminha para acontecer na Presidência Dilma.
A economia dá sinais de que o ciclo iniciado em 2005 deu tudo o que tinha de dar. Caminhamos, caso nada mude, para dar um grande salto para trás. Como em um jogo de ludo, devemos voltar para a "casa" 1994, antes do Plano Real. Gastos públicos sem controle, falta de um projeto econômico e inflação, combinado com taxas espasmódicas de crescimento.
O mercado está descrente. Recebe cada declaração do ministro Guido Mantega com a mesma confiança quando a ministra Zélia Cardoso de Mello dizia, no governo Collor, que tudo na economia estava caminhando bem. E quanto mais o governo insiste que a inflação está sob controle - desmentindo a realidade - maior a desconfiança.
Apesar da falta de rumo na economia, dos sucessivos escândalos - mantendo a média da Presidência anterior, diga-se -, da incompetência administrativa, da inexistência de uma política estratégica e de tantas outras coisas, a presidente Dilma governa absolutamente tranquila. Entregou para os oligarcas, sempre sedentos para saquear o Erário, rendosos cargos; usa e abusa do BNDES, oferecendo, como uma rainha absolutista, fortunas ao grande capital parasitário; soldou uma aliança com as grandes construturas - importantíssimas para financiar os partidos da base governamental, especialmente o PT - danosa ao interesse público, e cooptou as centrais sindicais, que foram adquiridas por um valor baixo, comparado ao que custou o apoio do grande capital.
Se durante o auge econômico do regime militar a repressão impedia a existência da política, hoje o quadro é distinto. A primeira diferença é que o país caminha a passo de tartaruga, a segunda - e mais importante - é que vivemos em um regime de plenas liberdades democráticas. Agora é o abandono da política que não possibilita uma saída para a economia. O mais incrível é que o governo agrega apoio não pela sua competência política ou econômica, mas pela recusa consciente da oposição ser oposição. O mérito, portanto, não é produto da eficiência da presidente. O problema da oposição reside nela própria.
Fernando Henrique Cardoso escreveu um longo ensaio propondo a discussão pública dos rumos da oposição. Como, especialmente, o PSDB, seu partido, recebeu o desafio? Negando-se a discuti-lo. O autoproclamado líder da oposição parlamentar, Aécio Neves, disse: "Vejo o futuro da oposição numa ótica mais otimista." Pela declaração é possível concluir que o senador não leu o ensaio. Ou confundiu o tema com um livro de autoajuda. O mais triste é que ele se julga, desde já, o candidato oposicionista à Presidência em 2014. Como? O que pensa sobre o Brasil? Consegue debater seriamente os principais pontos do ensaio do ex-presidente? A resposta é óbvia: não. Ele é a mais fiel representação do primarismo da oposição brasileira: personalista, vazia de ideias e pouca disposta a combater o governo.
O desafio para qualquer oposição em um regime democrático é ter votos. A oposição brasileira, no segundo turno, teve 44% dos votos válidos. Isso após uma campanha errática e despolitizada. O problema, portanto, não é ter votos. A oposição tem - e muitos. A questão é outra: quer agir como na República Velha, garantir um canal privilegiado com o governo e só no momento eleitoral se apresentar para os eleitores. Essa estratégia pode até dar certo, mas na esfera estadual e onde não existe debate político. No campo federal está fadada ao fracasso.
Em meio a este vazio, os eleitores oposicionistas mais politizados ficam sem saber para onde ir. Não têm representação partidária. Seus representantes no Congresso Nacional estão silenciosos. Como explicar que o senador mais votado do Brasil, Aloysio Nunes Ferreira, até hoje não tenha feito um pronunciamento analítico sobre os rumos da oposição? E como justificar que José Serra, que recebeu 44 milhões de votos, continue em uma espécie de silêncio obsequioso? Se a oposição não tem líderes, como fazer oposição?
Em política não existe vazio. O PT sabe muito bem disso. E vai ocupando todos os espaços na máquina pública e desde já estabelecendo alianças eleitorais para 2012. Age profissionalmente, sem piedade ou sentimento. O que vale é ampliar o poder, custe o que custar. E custa muito, como sabemos. As empresas e os bancos estatais estão entregues aos partidos da base. O PT reservou para si o que é mais lucrativo, e que permita estabelecer a conexão com o grande capital, negócio muito bom para ambos os lados e péssimo para o Brasil.
Para o governo, quanto menos política, melhor. Quer banalizar o debate. Não precisa convencer politicamente ninguém. Para os parlamentares usa o método delubiano. Quem tem de fazer politica é a oposição. Não é possível assistir um governo destruindo o que foi edificado com tanto sacrifício. Não é plausível recusar a construir canais efetivos de participação da sociedade civil nos partidos (que sequer ocorre nos momentos pré-eleitorais). É inadmissível que 44 milhões de eleitores não tenham voz no Congresso Nacional.
# por Anônimo - 3 de maio de 2011 às 15:26
Acompanhei sua partcipação no Jornal da Cultura ontem e fiquei contente por ver sua defesa dos valores democráticos. Como pode o MEC aprovar livros "petistas"?
É bom saber que alguém ainda enxerga tudo isto que tem acontecido no Brasil. Quando acompanho notícias dos principais meios de comunicação, tenho a impressão de que estão todos de olhos tapados. Então procuro espaços como este blog para ver se ainda resta alguém com lucidez. Parabéns, Villa.
# por Anônimo - 3 de maio de 2011 às 15:30
Professor, bom o artigo. Interessante ressaltar que a resposta do senador por Minas Gerias ao ensaio de FHC, deveria ser até esperada. Primeiro, ele não leu o ensaio. Se o tivesse feito, não veria nenhum pessimismo no que disse FHC. Segundo, não ter lido a data de vencimento de sua carteira de habilitação, pode ser tomado como demonstração da não leitura do ensaio. Quanto aos governistas, também não leram. Se leram, nada entenderam. A pose que fazem ao tecer críticas ao que acham que FHC escreveu, como o termo "povão", mostra que não leram e não entenderam. No máximo, ouviram alguém dizer que FHC a utilizara em seu ensaio. Bastou para o ex-presidente sair falando e depois, dizendo que o PT iria procurar a classe média. Como se o PT não fosse classe média, ele não fosse classe média e tivesse eleitores na classe média. Depois, FHC não falou para não procurarem o "povão". Ele falou que o PT cooptou vários segmentos do eleitorado. Nesse mérito, não entraram. É uma verdadeira pobreza a atuação e o pensamento político desse pessoal. Não é à toa que um novo partido é lançado, sem divulgar sequer um manifesto e muito menos um programa. E consegue um número significativo de aderentes. Estamos numa Democracia e as pessoas podem tomar as decisões e as atitudes que a Democracia possibilita. Porém, algo não está indo bem em decisões políticas. E já faz tempo.
Dawran Numida
# por Anônimo - 3 de maio de 2011 às 16:03
E a oposição silencia, ou se acua, num momento em que o partido da presidente está em crise. Teve de absorver Delúbio Soares e trocar de presidente. Aliado a isso, no aspecto gerencial, fica patente a incapacidade do governo em enfrentar os problemas econômicos, onde a inflação sobe. E gerencialmente, a presidente não consegue estabelecer diretrizes perceptíveis e tranquilizadoras aos agentes econômicos.
Dawran Numida
# por Anônimo - 3 de maio de 2011 às 20:01
A nossa sociedade não tem ainda maturidade política para defender plataformas, até porque algumas delas inexistem. Mas as poucas que existem defem ser defendidas por si, não pelas pessoas que as representam. Seria o exercício da consciência política, mas se você falar a palavra política perto de alguém só vai ouvir essa pessoa dizer: “não gosto de política”.
Para os que insistem em repetir tal heresia, eu digo: enquanto o homem viver em sociedade, não há como não gostar de política. Ela está em tudo o que fazemos, nos caminhos que tomamos e nos frutos que colhemos. Não dá pra votar nesse ou naquele por gostar da pessoa ou do sorriso que ela tem. Nos EUA, que são uma democracia cheia de problemas mas certamente tem muito mais consciência política, é muito comum ouvir o pai dizer para a filha que quer para ela um marido republicano ou democrata. Aí estão representadas uma série de escolhas políticas, muitas vezes antagônicas, mas que são bem entendidas por todos. O que me entristece é presenciar a nossa total e completa despolitização presente em todos os níveis sociais, simplesmente dizendo que gostamos desse ou daquele candidato, sem nos preocuparmos com o que ele representa. Até porque, na maior parte das vezes, ele representa a si mesmo e a seus interesses.
# por Bruno - 5 de maio de 2011 às 13:19
O mais preocupante nesse cenário político atual é a oposição, que não aproveita essa grande oportunidade, como perdeu em 2005 no mensalão, de virar a mesa dessa bandalheira e mostrar ao país o que o PT representa.
Essa fórmula de não atacar o que está indo bem já deu mostras de fracasso.
A oposição representa a maioria do povo brasileiro, mesmo derrotada nas eleições.
Temos que nos reunir para acabar com essa ´´anestesia Lula´´ que reina absoluta.
O que tem de tão fenomenal num presidente que desrespeitou a Constituição em todos os dias de seu governo? Que passou por cima dos Tribunais de Contas? Que desafiou a Suprema Corte Brasileira? Que debochou dos eleitores? Que contuduziu o maior assalto aos cofres públicos já visto na história? Que queria exterminar os oponentes políticos? etc.....
Um atributo não pode ser retirado do apedeuta: Ele inventou a fórmula que, quanto mais corrupto e incompentente seja o governo, mais a popularidade deste subirá.
Argumento para a oposição não falta. Pelo jeito, a oposição está querendo se unir ao Governo.
O PT e o Lula nem precisarão ´´exterminar´´ a oposição, ela se encarrega disso sozinha......