Tarefas da oposição
Este artigo foi publicado em "O Globo" de hoje. Muito do que Serra escreveu foi debatido por mim e pelos comentaristas neste espaço.
Oposição para quê?
José Serra
O principal risco que correm as oposições - e, portanto, também o PSDB - é perder tempo em embates menores, combates internos fantasmas ou antecipações irrealistas, como trazer 2014 para hoje, inventando bandas de adversários... internos! Atacar, constranger, prejudicar ou atrapalhar companheiros do próprio partido só faz ajudar os adversários reais, que incentivam esses confrontos.
Para o maior partido da oposição, perder-se em disputas internas seria apequenar-se. Saímos das urnas com quase 44 milhões de votos, vencendo a eleição presidencial em 11 estados. O PSDB fez oito governadores; o DEM, dois, e tivemos ainda o apoio do governador de Mato Grosso do Sul. Aqueles que votaram em nós queriam que ganhássemos, mas sabiam que podíamos perder. A oposição, portanto, é tão legítima quanto o governo; ela também expressa a vontade do eleitor e tem um mandato.
Não podemos deixar o eleitorado que nos apoiou sem representação. É ele, inicialmente, que precisa receber uma resposta e convencer-se de que não jogou seu voto fora. Até porque as ditaduras também têm governos, mas só as democracias contam com quem possa vigiá-los, fiscalizá-los, em nome do eleitor. Por isso a oposição tem de ter posições claras, ser ativa, sem se omitir nem se amedrontar. Uma eleição presidencial não é uma corrida de curta duração, de 45 dias, mas uma maratona de quatro anos. E ninguém corre parado.
Até quem votou no PT conta conosco para que ofereçamos alternativas, para que possamos aprimorar propostas do governo e denunciar, quando é (e como está sendo) o caso, a falta de rumo. Não se trata de fazer oposição sistemática ou não sistemática, bondosa ou exigente. Isso é bobagem! Essa questão não se coloca em nenhuma grande democracia do mundo. A oposição tem o direito e o dever de expressar seus pontos de vista e de batalhar por eles. É seu papel cobrar coerência, eficiência e honestidade.
A realidade está aí. O grave problema fiscal brasileiro veio à luz, herança do governo Lula-Dilma para o governo Dilma. A maquiagem nas contas não consegue escondê-lo. A Fundação Nacional de Saúde (Funasa) se transformou no retrato perverso do aparelhamento do Estado, que não se vexa nem diante da realidade dramática da saúde - ou falta dela - dos pobres. O mesmo acontece em Furnas, palco de escândalos há muitos anos, expressão do loteamento do setor elétrico, onde os blecautes têm sido a regra, não a exceção. Se a oposição não se fizer presente agora, então quando?
Fazer oposição por quê? Porque o país experimenta um óbvio desequilíbrio macroeconômico, que reúne inflação alta e em alta, juros estratosféricos, câmbio desajustado, vertiginoso déficit do balanço de pagamentos e infraestrutura em colapso. As trapalhadas do Enem mostram que o PT tripudia sobre a esperança e o futuro dos jovens. A imperícia do governo na prevenção de catástrofes e socorro às vítimas não requer comprovação. Por que fazer oposição? Porque os brasileiros merecem um governo melhor e pagam caro por isso - uma das maiores cargas tributárias do mundo, sem serviços públicos à altura. Temos o direito de nos apequenar com picuinhas? Foi para isso que recebemos um mandato das urnas?
O governo vem fazendo acenos à classe média e às oposições. Conta com o conhecido bom-mocismo dos adversários, tucanos à frente. Sua intenção é lhes tirar nitidez e personalidade, dividi-los e subtrair-lhes energia e disposição. Até a próxima disputa eleitoral, quando, então, voltaremos a enfrentar os métodos de sempre: vale-tudo, enganações, bravatas e calúnias. Cair nesse truque corresponde a trair a confiança dos que votaram em nós e os interesses do nosso povo e do país.
O PSDB não sabe fazer oposição! Tanto em 2006 como em 2010, pesquisas internas apontaram ser essa uma das críticas que o eleitorado nos faz. Ainda que fosse injusta, seria forçoso reconhecer que nos tem faltado nitidez. É razoável que o eleitor considere que não sabe governar quem não sabe se opor.
E nós temos os bons fundamentos! A quem pertence a bandeira da social-democracia no Brasil?
O PT, fundado como um partido classista, sob a inspiração de partidos leninistas, varreu estatuto e ideário para baixo do tapete ao chegar ao poder e adotou como suas a plataforma e as ideias do adversário. Mas, longe de estar resolvida, após seis eleições presidenciais, sendo três vitoriosas, e dois governos depois, a contradição entre os "pragmáticos do mercado" e os "puros-sangues de Lenin" ainda é um dos flancos do PT não devidamente explorados pela oposição, para prejuízo do país.
O PT adotou as bandeiras, mas perverteu sua prática. Privatizou as ações do Estado em benefício do partido e aliados. Banalizou o que a vida pública brasileira tinha de pior. Rebaixou a Saúde e a Educação. Transformou em instrumento eleitoral a rede de proteção social herdada do governo FHC.
Virou as costas para a Segurança e descuidou-se da Previdência. A falsa "social-democracia" petista preside um processo de desindustrialização do Brasil e mantém como principal despesa do orçamento o pagamento de R$180 bilhões anuais em serviço da dívida pública interna. Sem mencionar erros infantis, como o de reconhecer a China como economia de mercado, enfraquecendo nossos mecanismos de defesa comercial. Que social-democracia é essa, que pôs a perder o ativismo governamental nas coisas essenciais, que caracteriza o Estado do Bem-Estar Social e seus alicerces?
Essa retomada dos valores da social-democracia, com seu respeito ao jogo democrático e sua prioridade à garantia de condições dignas de vida à população, há de tirar do PSDB o falso carimbo de partido da elite e marcar diferença com o PT, com suas práticas sectárias e/ou ineptas.
Para tanto, é fundamental ao PSDB fortalecer a unidade interna, dando uma resposta àqueles que nos delegaram um mandato por meio das urnas.
Estou, como sempre, a serviço da população. Ajudei a definir as bandeiras históricas do meu partido e sua renovação. Por elas e pela unidade, batalhei sempre. Ninguém andará em má companhia seguindo os Dez Mandamentos. Para quem está na política, sugiro um 11º, este de inspiração humana, não divina: "Não ajudarás o adversário atacando teu colega de partido."
# por Anônimo - 10 de fevereiro de 2011 às 16:35
Bobagem de perdedor chorão!
# por Anônimo - 10 de fevereiro de 2011 às 20:33
Se tivesse adotado esse discurso de oposição séria e responsável, e não apelado para ficar beijando imagem de Nossa Senhora e visitas a pastores pouco recomendados, talvez tivesse ganho a eleição, ou pelo menos sairia com a reputação melhor. Eu fui eleitor do Serra para Senador, no passado distante, e para Governador, mais recentemente, mas não me decepcionei pelo caráter fundamentalista e messiânico que ele tomou na última eleição, que na minha modesta opinião jogou por terra toda a trajetória política dele e qualquer coerência.
# por Anônimo - 10 de fevereiro de 2011 às 20:33
http://oglobo.globo.com/pais/noblat/posts/2011/02/10/chico-caruso-362126.asp
# por Anônimo - 10 de fevereiro de 2011 às 20:40
Chega de política, vamos ao que interessa: http://www.estadao.com.br/especiais/musa-do-carnaval,131144.htm
# por Anônimo - 10 de fevereiro de 2011 às 21:42
Errata em #2 por Anônimo - 10 de fevereiro de 2011 20:33:
"mais recentemente, mas me decepcionei" ...
# por barbarah.net - 10 de fevereiro de 2011 às 23:13
Citar Os Mandamentos parece imposição religiosa. Há pessoas que não se identificam com as verdades de Moisés e não gostam de carolice.
# por Anônimo - 11 de fevereiro de 2011 às 09:00
O que querem os eleitores que votaram em Serra na eleição presidencial é o discurso circunstanciado no artigo de sua lavra. Votamos sabendo que podíamos perder, não só votando na oposição para presidente, mas também para governador, senador, deputado federal e estadual. O que não podem, os depositários de nossos votos, agora, eleitos ou derrotados, nos envergonharem de nossas escolhas. Serra nos honra nesse momento, embora não tenha feito o suficiente na campanha para ter 44 milhões de votos. Mas não basta discurso, pois nisso os petralhas são imbatíveis.
# por Unknown - 11 de fevereiro de 2011 às 10:30
Olha a mentalidade do #1! Olha nas mãos de quem esse país está... gente que vê política como se fosse um Fla-Flu...
# por barbarah.net - 11 de fevereiro de 2011 às 17:05
Hélio Bicudo revela quais eram as intenções do Bolsa Família segundo José Dirceu.
(Decanos Brasileiros - Estadão)
# por Anônimo - 11 de fevereiro de 2011 às 19:17
Serra está correto no que escreve, diagnostica e recomenda. Incrível, como as situações são distorcidas. Serra sempre foi declaradamente católico e contra o aborto. Na campanha, foi questionado pelo fato da adversária não ter nunca definido qualquer aspecto sobre religião e outros temas e ter dado declarações infelizes sobre os temas. A adversária sempre foi contraditória, insegura e sem clareza ao desenvolver qualquer assunto. Não houve qualquer caráter messiânico na postura de Serra, muito pelo contrário. Quem não soube definir-se nunca foi a adversária. Contudo, distorceram as coisas e continuam distorcendo.